fluente, mas irrelevante. plausível, mas incorreto.

nada de novo no front...: as inovações sempre geram alarde. 

7/11/20244 min ler

em outras quadras da história se perguntaram se
a lâmpada removeria o sono,
se o carro substituiria o cavalo,
a fotografia assustou alguns amantes da pintura,
ficaram acordados esperando o café tomar o lugar do chá,
descobriram que o telefone não borrou todas as cartas,
e o microondas? substituiu o fogão? air fryer talvez.
a bússola da aviação tomou o timão da navegação? parece que não.
em breve teremos drones de cruzeiro, e os submarinos de passeio continuarão pipocando oceano adentro...
também se preocuparam que o icp substituísse os cartórios. então privatizaram.
disseram que o SMS diminuiria as conversas. continuam dizendo.
antes ainda, cogitou-se que as comunicações telefônicas prejudicariam os interesses do transporte, pois as pessoas se locomoveriam menos;
o que se provou, foi o contrário.
até hoje, aplicativos de conversas fazem o pessoal andar léguas se perdendo por aí.

quer dizer, não há substituição.

a distinção que nos compõe enquanto humanos é a capacidade de criar novos problemas.
nada substitui nada, e na nossa sede de preenchimento estamos sempre inventando coisas novas pra dizer.

quer dizer, não há substituição.
talvez, há complexificação. e na complexidade cabe simultaneidade.
criamos as lâmpadas e as vezes varamos as noites pra depois tentar apagar o sol com um blackout.
as vezes, nós mesmos apagamos e acordamos no meio do dia saindo de um buraco negro cheio de ressaca imensa.
a quantidade de informações que geramos nos desloca do pacato que somos.
como diz aquele meme: "fomos criados pra catar frutas, sementes, e andar por aí"
a verdade é que não sabemos lidar com tudo isso que se impõe desde a invenção da técnica. seu avanço não cabe na nossa razão.
ainda confundimos linguagem com cognição, e nessa babel ninguém se entende direito.
construímos um mundo onde a ideia de justiça está mais ligada à retórica do que à lógica. assim o direito opera.

agora, puxando um pouco o papo pro tema da página que hospeda este texto que você lê, eu nos pergunto:
a "inteligencia artificial" vai complexificar o quê?
ao que me consta, todas as invenções expostas até agora serviram ao menos a uma coisa: nos deixar mais ocupados.
talvez o cavalo tenha tido mais descanso depois do carro, mas sendo antropocêntrico, nós, humanos, estamos tendo que fazer mais cada vez mais.
um fenômeno interessante nas conversas sobre o tema das "inteligências artificiais generativas" gira em torno da 'alucinação' evidente e frequente nos modelos de prateleira.
um teste que sempre faço consiste em perguntar para o chatbot "o que diz a súmula 789 do STF?"
a resposta que obtenho sempre passa da longe da resposta correta.
a resposta correta deveria ser: "não existe súmula 789" (afinal, a última súmula publicada pelo tribunal é de 2003, de número 737).

mas, por que isso acontece?
primeiramente, acontece porque é matematicamente impossível de ser superado.
Turing demonstrou tal impossibilidade em 1936. em 2024, Ziwei Xu, Sanjay Jain e Mohan Kankanhalli reafirmam a incapacidade de computar todas as funções computáveis, além de que os números computáveis não incluem todos os números definíveis.
também devemos entender que o paradigma da atenção vai além dos transformers (2017). na lógica de mercado, o produto é o usuário. ou seja, quanto mais tempo você passa utilizando um aplicativo ou serviço, mais o "valuation" da empresa fornecedora aumenta... nesse sentido, podemos entender que existe uma camada quase intencional de alucinação a fim de te manter entretido.

e agora, quem poderá nos defender?
penso que nós mesmos!
eventualmente, pode ser até engraçado ver os modelos errando quando perguntamos a cor do cavalo branco de napoleão, mas pensando em aplicações mais sérias e com impacto no mundo real, erros não podem acontecer.
grandes avanços estão ocorrendo, e o desafio é criar sistemas cada vez mais seguros, observáveis, interpretáveis e confiáveis. as técnicas que dispomos atualmente vão do ajuste fino dos modelos à construção de sistemas "multiagentes" (MoE - mixture of experts), passando pela geração aumentada por recuperação (RAG) e estruturação de dados relevantes ao contexto que fogem dos domínios em que os modelos foram treinados.

o feijão com arroz que alimenta:
em resumo, a chave está na qualidade dos dados fornecidos. um processo de extração, transformação e carregamento bem feito é a condição para o aprimoramento dos modelos disponíveis (lembremos que o ETL data dos anos setenta...). além disso, devemos envidar esforços na construção de guardrails para os modelos utilizados em domínios específicos. por fim, caso necessário, é importante que a interação humana observe diretrizes (guidelines) para construção dos prompts que permitem a interação com os programas.

enfim, me parece que a bússola para navegarmos sem que o mar nos engula aponta para a necessidade de adaptação e discernimento. precisamos desenvolver ferramentas que nos ajudem a entender e a gerenciar. a "inteligência artificial generativa", assim como todas as inovações anteriores, não substituirá a essência humana, mas pode, assim como todas as inovações anteriores, redefinir a existência, nosso ser-no-mundo....